segunda-feira, 30 de abril de 2012

Usinas do Madeira mudam a realidade do rondoniense


Torre de transmissão no rio Madeira
Torre de transmissão no rio Madeira

PORTO VELHO – A vida mudou para os ribeirinhos de Rondônia, no extremo oeste da Região Norte, onde o governo brasileiro esta construindo duas hidrelétricas gigantes no rio Madeira. A vila de Mutum Paraná desapareceu e deixou saudades para as crianças e mais velhos. A pequena comunidade foi inundada com o avanço da obra da Usina Hidrelétrica de Jirau, a cerca de 150 quilômetros de Porto Velho. A obra faz parte do Complexo do Madeira obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).
Dona Nena passou vida toda na comunidade que agora está debaixo d’água. A aposentada é uma das moradoras das casas pré-moldadas da Nova Mutum, conjunto habitacional construído pelo consórcio de empresas da Usina Jirau, como forma de compensação social por causa dos impactos causados pela obra. Ela reclama que as casas foram entregues de qualquer jeito e fala do alto custo de vida. Viver longe do rio é o maior pesadelo para quem sempre viveu da fartura dos peixes.
As margens da rodovia BR 364, a vida não esta sendo fácil, afirma um ajudante de serraria que ja não sabe mais o que fazer para pagar as contas.
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Emprego, bares e prostituição
Mas nem todo mundo reclama. O mecânico Jair considera a mudança um bom negócio para toda a família. De Casa Nova e espaçosa, comparada a que morava na antiga Vila, ele comemora a oportunidade.
O Distrito mais próximo de Nova Mutum e da Usina de Jirau fica a 39 quilômetros de distância. Jaci Paraná é um garimpo a céu aberto. Investir em bares e casa de shows se tornou um bom negócio da cidade. É o mesmo que estar numa ” fofoca do metal precioso” – jargão do garimpeiro para lugares onde há muito ouro -  afirmam os moradores mais antigos.
Até quem trabalhou para a usina hidrelétrica e agora mantém o próprio negócio, considera que existe ouro nesse garimpo sem brilho, ofuscado pela prostituição que se tornou atividade lucrativa, depois da chegada dos trabalhadores da Usina de Jirau.
Obras de Santo Antônio no rio Madeira
Obras de Santo Antônio no rio Madeira

No auge da construção da Usina,  o distrito de Jaci Paraná que fica no km 86 da BR-364, chegou a ter 22 mil habitantes. Agora, não passam de oito mil, mas os problemas sociais continuam.  Na realidade, os problemas só aumentaram, afirma uma empresária. Ela aguarda ansiosa pela intervenção do poder público e ainda tem esperança de que as autoridades retomem o controle da situação e façam valer os direitos garantidos na constituição brasileira: serviços básicos de saúde, educação e infraestrutura, e que o estatuto da criança e do adolescente seja cumprido.
A saga do Madeira e a ousadia da obra

O rio Madeira nasce na cordilheira dos Andes, na Bolívia, com o nome de Mamoré. Desagua no rio Amazonas, 1.500 quilômetros depois de passar pelo meio da floresta Amazônica, ajudando a formar a maior bacia hidrográfica do planeta. E um dos principais afluentes do maior rio do mundo e a população ribeirinha depende de suas águas. Do pescado ao ouro, tudo vem do majestoso de águas barrentas. O rio leva sedimentos e nutrientes para fauna e flora das matas ciliares. Mas, a fúria das águas tem dificultado o acesso ao alimento. Os peixes estão cada vez mais raros, confirma o pescador Edvaldo, com experiência de mais de 20 anos de trabalho.
O desafio do governo brasileiro de construir duas enormes hidrelétricas no rio Madeira: Jirau e Santo Antonio, está na mesma proporção da dimensão dos dois empreendimentos que impressionam pela ousadia. Em pleno funcionamento, as duas hidrelétricas vão garantir energia para todas as regiões do Brasil. A energia produzida nas duas barragens só vai ser superada pela binacional Itaipu, no Paraná e  Tucuruí, no Pará. Os recursos para a construção vêm do Fundo de Amparo ao Trabalhador, do FGTS e de Bancos Públicos e Privados. O custo das duas usinas está estimado em 23,8 bilhões de reais, obras consideradas  essenciais para o Plano de Aceleração do crescimento no sentido de garantir a estabilidade energética do pais.
Os canteiros de obras atraíram trabalhadores de todas as regiões de pais. Oportunidade de emprego e renda, qualificação de mão-de-obra local, mas também de aumento de problemas sociais em Porto Velho e cidades próximas.
“As usinas hidrelétricas da madeira vão gerar muito mais que energia elétrica para mais de 80 milhões de brasileiros. O complexo vai gerar qualidade de vida e desenvolvimento sustentável. Em Porto Velho capital mundial da geração de energia sustentável, a cidade que mais cresce no Brasil, as ruas escuras estão com os dias contados. Os bairros periféricos já estão sendo contemplados com projetos de iluminação pública”,  afirma o superintendente da Empresa Municipal de Desenvolvimento Urbano (Endur).
Dasafio Ambiental
A construção das duas enormes hidrelétricas no rio Madeira passou por várias etapas. Da licença ambiental à autorização para a comercialização da energia produzida no local, foram analisados vários fatores de risco: benefícios e problemas levados em conta. Como compensar, por exemplo, os impactos sociais, econômicos e ambientais agora que os reservatórios das barragens estão cheios? O dois lagos inundaram uma área superior a 500 quilômetros.
Reproduzir o ambiente natural das plantas nas Áreas de Proteção Permanente, as APPs, e uma das alternativas para compensar os danos ambientais causados pelas obras das duas barragens. O trabalho requer estudo aprimorado. Bromélias, acácias e orquídeas estão na lista de espécies que serão usadas na revegetacao do perímetro de cem metros, no entorno do lago, da beirada pra dentro da floresta. As espécies nativas foram retiradas das áreas inundadas e agora estão sendo cultivadas em um viveiro construído no Parque Natural de Porto Velho. Mesmo com todos esses cuidados, as obras das duas Usinas modificaram a paisagem de parte da floresta Amazônica, inundaram cachoeiras e eliminaram do mapa comunidades ribeirinhas, obrigando a população nativa a se mudar do local de origem.
Madeira avança e causa desbarrancamento
Na orla de Porto Velho, os problemas de desmoronamento de terra se agravaram. Nem a herança da velha estrada de ferro Madeira-Mamoré – Patrimônio Histórico do Estado foi poupado. Os trilhos da antiga estrada de ferro começam a se desprender do barranco. O morador Oliveira que reside numa casa, prestes a desabar, na beira do rio Madeira, nunca tinha visto nada igual. Ele teme pelo pior daqui pra frente.
A Defesa Civil do município notificou os moradores da Orla do Bairro Triangulo, na zona central da capital rondoniense e determinou a retirada imediata de todas as casas das áreas de risco. As mudanças repentinas que estão acontecendo as margens do rio Madeira tinham sido previstas desde o início dos estudos do projeto básico de construção das Hidrelétricas.
Mesmo assim, muita gente ainda se assusta com o preço que esta sendo pago  para a geração de energia sustentável na Amazônia. Desde as primeiras expedições portuguesas ate hoje, os rios brasileiros estiveram presentes no dia a dia dos ribeirinhos. Em Rondônia, o velho Madeira avança com sua fúria pelos barrancos, atravessando limites. Enquanto isso, na cidade artificial, as populações tradicionais lamentam a perda da vida natural, que ficou lá trás, tragada pelo progresso.

Edição Web: Gláucia Chair

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