quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Laboratórios brasileiros desenvolvem bioprocessos a partir de células de drosófilas

Unindo esforços há quase uma década para desenvolver bioprocessos que envolvem células de drosófilas (Drosophila melanogaster), uma rede multidisciplinar de cientistas brasileiros se tornou a principal referência mundial na área.

Utilizada em ampla gama de estudos genéticos, a drosófila é um dos mais importantes organismos modelo para a biologia. Os estudos – que envolvem desde técnicas de clonagem de genes até o desenvolvimento de bioprocessos para a produção de proteínas virais – poderão estabelecer protocolos que permitam a aplicação do conhecimento sobre as drosófilas na produção de vacinas.

Um estudo de revisão que sintetiza alguns dos principais resultados obtidos pela colaboração foi publicado recentemente na revista Biothecnology Advances.

Envolvendo cinco laboratórios multidisciplinares, a Rede de Tecnologias com Células Animais (TACnet, na sigla em inglês) é coordenada por Carlos Augusto Pereira, diretor do Laboratório de Imunologia Viral do Instituto Butantan e primeiro autor do artigo.

Compõem a rede cientistas do Laboratório de Engenharia de Biorreações e Colóides da Faculdade de Engenharia Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o Laboratório de Tecnologia de Cultivos Celulares do Departamento de Engenharia Química da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), o Laboratório de Biotecnologia Industrial do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e o Laboratório de Células Animais do Departamento de Engenharia Química da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP).

De acordo com Pereira, a TACnet começou a ser formada a partir de 2002, quando cientistas dos cinco laboratórios se uniram para participar do Projeto Temático “Expressão de genes heterólogos em células de dípteros: biologia molecular e engenharia de processos”, coordenado por ele e financiado pela FAPESP.

“O projeto tinha o objetivo de desenvolver bioprocessos envolvendo células de drosófilas. Pela característica essencialmente multidisciplinar do tema, foi preciso envolver grupos de excelência de várias instituições, incluindo biólogos, bioquímicos, veterinários, engenheiros bioquímicos”, disse Pereira à Agência FAPESP.

Embora o Temático tenha sido finalizado em 2010, a rede permaneceu ativa. “A tecnologia de células animais tem inúmeras aplicações e será cada vez mais utilizada. Nessa área, trabalhamos com tecnologias como a clonagem e expressão de genes, a formulação de meios de cultura, a identificação de fatores de crescimento celular, o aumento de escala de cultivos em biorreatores, a definição, modulação e controle do metabolismo celular, a transferência e controle de metabolismo oxigênio e modelagem matemática”, explicou.

No artigo de revisão, os pesquisadores descrevem as estratégias utilizadas para expressão de genes heterólogos – ou seja, provenientes de outros organismos – em células de drosófilas, utilizando vetores plasmídicos. Os cientistas obtiveram sucesso na expressão de uma proteína biologicamente funcional do vírus da raiva a partir de células recombinantes das moscas.

“O artigo descreve as estratégias desde a clonagem dos genes até o desenvolvimento de bioprocessos, reunindo a experiência adquirida pelo grupo no Projeto Temático. As proteínas recombinantes têm atualmente um papel central na produção de vacinas. Nós procuramos desenvolver tecnologias para esse tipo de produto usando células da drosófila”, explicou.

O objetivo, segundo Pereira, é estabelecer o conhecimento e as condições para o desenvolvimento de protocolos e parâmetros que permitirão a produção de vacinas no futuro.

“Poucos organismos são tão conhecidos como as drosófilas. Queremos aproveitar o conhecimento já existente na biologia tradicional para aplicá-lo no conjunto de tecnologias de produção de imunobiológicos. Nosso grupo é provavelmente o que possui mais experiência nessa área em todo o mundo”, afirmou Pereira.

Além da produção científica propriamente dita, o Projeto Temático teve impacto importante na formação de pessoal. No total, gerou 23 dissertações de mestrado e 10 teses de doutorado.

“O projeto teve o mérito de capacitar várias entidades e diferentes grupos em tecnologias que não existiam antes. Além disso, houve um grande número de co-orientações envolvendo pesquisadores de diferentes disciplinas, favorecendo a discussão de questões na fronteira do conhecimento. A cooperação multidisciplinar sempre foi um gargalo, mas conseguimos superá-lo”, disse.

Todos os subgrupos envolvidos atuaram ativamente do projeto, segundo Pereira, gerando a publicação de mais de 30 artigos em periódicos indexados, além de livros e capítulos de livros.

“Tivemos também grande número de apresentações de trabalhos em eventos nacionais e internacionais. Um total de 55 pessoas atuou de forma direta no desenvolvimento do projeto”, disse.

O artigo Drosophila melanogaster S2 cells for expression of heterologous genes: From gene cloning to bioprocess development, de Carlos Pereira e outros, pode ser lido por assinantes daBiotechnology Advances em www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22079894.

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