quarta-feira, 29 de junho de 2011

Conheça o amaranto, a planta que veio do frio

Por Viviane Taguchi | Fotos Ernesto de Souza

Ernesto de Souza
O grão tem características semelhantes às dos cereais e não contém glúten
O sol forte que empresta tons de laranja aos dias de inverno no Cerrado anuncia que é tempo de colher amaranto. A planta que veio do frio dos Andes para o calor do Planalto Central está ganhando terreno em um mercado que agrega valor em tudo que é mais rico em nutrientes e menos convencional na agricultura, o da alimentação saudável. Pesquisas científicas e adaptações de sementes ao clima e solo do Cerrado, elaboradas pela Embrapa Cerrados, resultaram na variedade BRS Alegria e despertou o interesse – ou tem feito a própria alegria - de agricultores que investiram no cultivo. Em Brasília, é possível comprar um quilo de grãos de amaranto direto do produtor por R$ 9, enquanto em São Paulo esse é o valor médio de 100 gramas de flocos do pseudocereal (sua composição nutricional é similar à dos cereais, mas não pertence à categoria). “Há disparidade de preços porque a produção nacional é tímida e precisamos importar o amaranto”, explica Carlos Spehar, professor da Universidade de Brasília (UNB) e responsável pela introdução da espécie no Brasil. O cientista a trouxe o vegetal do Peru nos anos 1980 e obteve a variedade adaptada cerca de dez anos depois, quando começou distribuir sementes para produtores de feijão do Centro-Oeste. Hoje, Spehar aponta cultivos do grão – que ele chama de feijão-dos-andes – no Cerrado, e no sul do país.


Ernesto de Souza
Walter Ribeiro, da Embrapa: "Tolerante à seca, o grão pode ser cultivado na safrinha de inverno"
A produção nacional precisa crescer muito para atender à demanda dos consumidores ávidos por alimentos mais saudáveis. Hoje, a safra gira em torno de oito toneladas anuais e a demanda é estimada entre 15 e 20 toneladas. “São pessoas que têm um poder aquisitivo alto e não se importam em pagar mais para ter no prato um alimento mais rico, mais saudável”, ressalta Spehar. Walter Quadros Ribeiro Junior, da Embrapa, diz que, apesar da produção nacional ser pequena, a produtividade do amaranto no Cerrado supera a de países que o produzem em larga escala, como Peru e Bolívia. “A produtividade de nosso grão é de três toneladas por hectare, enquanto a média alcançada nesses países é de duas a 2,5 toneladas por hectare”, afirma o pesquisador. Ribeiro explica que o cultivo do amaranto pode ser feito em três épocas, safra, safrinha e inverno, e a produtividade depende da quantidade de água disponível para irrigação e dos índices pluviais do período. “Os melhores índices foram registrados na safra de inverno”, afirma. Spehar lembra que o uso da tecnologia possibilita produzir o ano todo. “Irrigação, correção de solo e equipamento adequado garantem produções permanentes”, diz.


Ernesto de Souza
A variedade da planta adaptada ao calor brasileiro supera os índices de produtividade de países andinos
O engenheiro agrônomo Sebastião Conrado de Andrade, proprietário da Fazenda Dom Bosco, em Cristalina (GO), pouco sabia sobre o amaranto quando a espécie lhe foi apresentada, em meados de 2001, por Spehar. Hoje, com produção anual média de seis toneladas, cultivadas em duas safras, ele é o maior fornecedor nacional do grão. “Aposto no cultivo visando a um mercado de longo prazo”, conta Andrade, que também produz quinoa, feijão, soja e milho e cria gado. Para se expandir mais rapidamente, o produtor diz que é preciso investir em tecnologia de equipamentos. “Por se tratar de um grão muito pequeno, há um índice de desperdício grande na colheita e no plantio.” Na Dom Bosco, parte da produção também substitui a alimentação do gado. “O caule do amaranto promoveu boa digestibilidade e foi mais bem aceito que a quinoa.”

As qualidades do amaranto, valorizadas pelo extenso uso em civilizações antigas como alternativa medicinal, movimentam bastante o ramo gastronômico. “Mas poderíamos trabalhar mais e melhor se tivéssemos facilidade em encontrar o produto no mercado”, reclama o chef de cozinha paulistano Renato Callefi. De acordo com ele, há no mercado paulista uma demanda grande por grãos inteiros. “Encontramos flocos de amaranto em lojas especializadas, mas comprar o grão é muito difícil”, diz ele. É justamente o grão a forma mais valorizada na culinária. Aquecido em panela sem óleo, o amaranto vira pipoca e, triturado, se transforma em farinha. Apesar de Callefi afirmar que o segredo está no tempero do amaranto, “sem gosto específico”, ele diz que a procura por pratos com o grão cresceu muito. “É um alimento com qualidades equilibradas, baixo teor glicêmico e aminoácidos essenciais. É para pessoas exigentes com o próprio corpo.”

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O TEMPERO IDEAL | O chef de cozinha Renato Callefi indica o uso do amaranto em:
> risotos
> tabule
> cuscuz marroquino
> jambalaia
> pipoca
> complementos para saladas

> As sementes de amaranto são 15% mais ricas em cálcio, fósforo, zinco e proteínas e possuem quantidades de lisina e metionina superiores ao feijão. Também foi constatado que o amaranto possui teores do antioxidante esqualeno superiores aos dos peixes

> 100 g de amaranto correspondem a quatro fatias de pão integral ou oito barrinhas de cereal comum

> A farinha do amaranto pode ser utilizada em receitas de bolos, pães, tortas e biscoitos em dietas para celíacos (pessoas com intolerância ao glúten)
(fonte: FAO)


TEMPO BOM PARA O AMARANTO | Acompanhamento do cultivo indica que a safra de inverno pode gerar mais rentabilidade às fazendas produtoras:
SAFRA > O plantio é iniciado no final de outubro e começo de novembro. A colheita pode ser iniciada no início de janeiro, antes do período chuvoso.

SAFRINHA > O plantio ideal é feito após o término da estação chuvosa, entre o final de março e o começo de abril. A safra pode ser colhida em meados de maio.

INVERNO > É o período indicado como o que promove maior rentabilidade ao cultivo. O plantio começa entre maio e junho e a colheita em meados de setembro e outubro. “O amaranto é muito resistente à seca”, diz Ribeiro.

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